Infância sob ameaça digital

A infância pode ser abreviada quando crianças são expostas, precocemente, a padrões, comportamentos e responsabilidades do universo adulto.

Essa realidade, conhecida como adultização infantil, vem preocupando famílias, educadores e autoridades, especialmente pela força que ganhou com a popularização das redes sociais. O caso que reacendeu esse debate foi o vídeo divulgado em agosto de 2025 pelo criador de conteúdo Felipe Bressanim Pereira, o Felca, que denunciou situações de sexualização precoce, falhas de moderação nas plataformas e a forma como algoritmos favorecem a propagação desse tipo de material. A repercussão foi imediata, alcançando milhões de pessoas e provocando discussões no Congresso Nacional.

A adultização infantil se manifesta de diferentes maneiras: uso de roupas e maquiagens que remetem à estética adulta, exposição a conteúdos sexuais ou sugestivos, participação em interações amorosas ou sensuais antes da maturidade emocional e até cobranças de desempenho e postura típicas de adultos no ambiente escolar ou familiar. Embora possa ocorrer fora do mundo virtual, o ambiente digital acelerou e ampliou o alcance desse fenômeno. Com poucos toques na tela, crianças podem ser expostas a modelos de comportamento que não correspondem à sua fase de desenvolvimento, sem o filtro ou supervisão necessários.

Ponto crítico

O funcionamento dos algoritmos das redes sociais é um dos pontos críticos. Ao identificar que uma criança interagiu com um conteúdo de estética adulta, o sistema tende a recomendar outros similares, reforçando a exposição e criando um ciclo de consumo difícil de romper. Esse processo pode ser potencializado por interesses comerciais, já que conteúdos polêmicos ou chamativos costumam gerar mais engajamento e, consequentemente, maior retorno financeiro para criadores e plataformas. Em certos casos, pais e responsáveis, muitas vezes sem intenção de causar dano, contribuem para essa exposição na busca por popularidade ou ganhos econômicos.

As consequências para o desenvolvimento das crianças são preocupantes. A pressão para corresponder a padrões adultos pode gerar insegurança, ansiedade e baixa autoestima, além de distorções na percepção do próprio corpo. O contato constante com conteúdos sexualizados também compromete a compreensão de limites, consentimento e relações interpessoais. “É fundamental preservar o tempo de cada fase do desenvolvimento para que a criança construa sua identidade e valores de forma saudável”, afirma Letícia Dorighello, diretora pedagógica do Colégio Prígule, de São Paulo.

A legislação brasileira, por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente, assegura a proteção contra qualquer forma de exploração, incluindo aquela que ocorre no ambiente digital. Isso significa que pais, responsáveis, influenciadores e até empresas de tecnologia podem ser responsabilizados quando permitem ou incentivam a divulgação de materiais que coloquem menores em risco. A atuação de órgãos públicos tem se intensificado, com remoção de conteúdos, investigações e aplicação de penalidades.

Núcleo familiar

A proteção começa no núcleo familiar. Estar presente no cotidiano digital dos filhos, conhecer as plataformas utilizadas, estabelecer regras claras para o uso de dispositivos e manter diálogos francos sobre segurança e privacidade são medidas essenciais. Crianças que se sentem seguras para relatar experiências desconfortáveis têm mais chances de evitar ou interromper situações de risco.

No ambiente escolar, a contribuição passa por orientar estudantes e famílias sobre cidadania digital, segurança online, respeito e autoestima. A escola pode identificar sinais de adultização precoce, oferecer apoio e, quando necessário, encaminhar casos para acompanhamento especializado. A união entre escola e família fortalece a rede de proteção e amplia as possibilidades de intervenção.

O caso Felca também trouxe à tona a necessidade de políticas públicas mais eficazes, capazes de garantir ambientes digitais seguros para crianças e adolescentes. Propostas legislativas discutem medidas como verificação de idade, retirada rápida de conteúdos nocivos e responsabilização das plataformas que não atuarem de forma preventiva. Paralelamente, campanhas de conscientização devem alcançar diferentes regiões e contextos sociais, garantindo que a informação chegue a todos.

A importância da educação digital

A prevenção da adultização infantil exige esforço conjunto e constante. Envolve educação digital, acompanhamento ativo do uso da tecnologia, fortalecimento da autoestima e criação de ambientes — físicos e virtuais — que respeitem o estágio de desenvolvimento das crianças. Essa não é uma preocupação restrita a casos que viralizam, mas uma responsabilidade diária, refletida em pequenas decisões sobre consumo, lazer e comunicação. Proteger a infância é garantir que cada criança possa viver plenamente sua etapa de vida, com experiências adequadas, segurança e liberdade para crescer no seu tempo.

Para saber mais sobre adultização infantil, visite https://gauchazh.clicrbs.com.br/viral/noticia/2025/08/felca-e-adultizacao-saiba-o-que-aconteceu-apos-a-repercussao-do-caso-levantado-pelo-youtuber-cme9yiseu0008014lbnwnan1c.html e https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2025/08/13/monetizacao-exploracao-de-menores-e-redes-de-pedofilia-entenda-denuncias-feitas-por-felca.ghtml

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Gostou? Compartilhe com seus amigos

Mais para explorar